segunda-feira, 20 de junho de 2011

O Tempo do Final e o Ato Psicanalítico

Texto Preliminar às XIII Jornadas de FCCL-Rio (informações abaixo), de Zilda Machado.
Zilda é AME da EPFCL do Fórum do Campo Lacaniano de Belo Horizonte e será a próxima convidada do Seminário do Campo Lacaniano em Fortaleza. O encontro será no dia 02 de julho de 2011 e o tema é Desejo e Fantasia.


É com Lacan que o conceito de Ato analítico surge como uma noção inerente não só ao procedimento analítico, mas à própria formação do analista. A operação analítica, porém, já estava em curso há mais de meio século. Por que então Lacan pôde dizer no começo de seu resumo sobre o Seminário O Ato Psicanalítico: “O ato psicanalítico, ninguém sabe, ninguém viu além de nós?” [1]
Freud introduziu o ato na psicanálise, e o conceito de repetição que lhe é inerente. Ele mostra que há um tipo de ato que se repete pela via significante e outro que se repete por outra lógica, ou seja, desde os primórdios percebeu as duas lógicas do aparelho psíquico e a partir delas introduziu o ato na psicanálise. Inicialmente, o fez através da Psicopatologia da Vida Cotidiana – com os atos falhos e os lapsos - ou seja, a partir das formações do Inconsciente. Mas ele sabia que algo do aparelho psíquico era de outra ordem, o que o levou à virada dos anos 20. Algo no aparelho está para além da interpretação, para além da linguagem. Ou melhor, algo se apresenta não pelos tropeços de linguagem, mas por uma compulsão a “agir”. Temos o texto princeps “Recordar, repetir e elaborar” que aponta o limite da interpretabilidade, embora desde o início esse limite já estivesse posto. (confere: 1908 “As teorias sexuais infantis”, por ex.).
Mas foi Lacan que introduziu o conceito de ato inserido na própria operação analítica: o ato psicanalítico. É essa a grande novidade que ele traz ao cenário da psicanálise a partir da construção do objeto a, o operador da parte do falasser não articulável em linguagem. Com isso Lacan conseguiu operacionalizar o final de análise e levar o sujeito à transposição do rochedo da castração, o limite detectado por Freud. É nesse sentido que ele fala “o ato analítico, ninguém sabe, ninguém viu além de nós”. A partir daí muda-se radicalmente a idéia do final de análise e da análise didática.
Em que consiste propriamente o ato psicanalítico? Embora muitas vezes nos refiramos a todas as intervenções do analista como “ato analítico”, são duas apresentações do ato psicanalítico as que, nesse momento, me interessam mais de perto e que, me parecem, são de fato o que Lacan denomina ato psicanalítico: o ato que permite a entrada em análise (o primeiro umbral) e aquele que permite a saída, sua conclusão (o segundo umbral). Mas estas duas noções do ato analítico se referem a um único e mesmo ato, nos diz Lacan. O tempo de um se enoda ao tempo do outro e “constitui a repetição (...) que introduz o a posteriori próprio do tempo lógico” no seio da experiência analítica, nos diz Lacan na Proposição de 9 de outubro.
Começar uma psicanálise é um ato? se pergunta Lacan no Seminário 15. Certamente que sim. Mas quem é que produz esse ato? Para aquele que se engaja em uma análise, a regra de ouro da psicanálise é justamente que na cena analítica ele se abstenha de agir e que fale tudo o que lhe vier à cabeça, ou seja, “fale e não faça”. Neste sentido, nos diz Lacan, o ato analítico não está do lado do analisante. A ele cabe a tarefa analisante, através da associação livre. O ato analítico, o que autoriza a tarefa psicanalisante[2], provém do analista. É nesse momento, que Lacan trata a questão de que o que está em jogo é o enodamento que enlaça na análise que se sustenta, a própria análise do analista. Portanto, para tratar da entrada em análise de um analisante qualquer, o que está presente é o ato analítico que instituiu o analista que naquele momento conduz aquela análise.
O verdadeiro ato, portanto, é aquele que teve lugar na análise do analista. Aquele que levou o então analisante ao ultrapassamento do segundo umbral, o que fez dele um analista e que justamente no mesmo golpe, atingiu em cheio o Sujeito suposto Saber, fazendo-o decair de sua função – aí está o des-ser do analista, diz Lacan. Nesse momento preciso houve o ato analítico, proferido (instituído, atuado, praticado? é difícil encontrar uma palavra, pois não há sujeito do ato) por aquele que, justo neste ato, se instituiu analista, o que só ocorreu porque houve a queda do Sujeito suposto Saber. É da ordem de ou um ou outro. Em havendo o ato, instituiu-se ali o psicanalista, e este ato inscreverá no psicanalista uma marca, um “label”, um rótulo, que a partir dali terá a ver com o modo pelo qual ele poderá sustentar as análises que tomar a seu cargo. Uma marca que seus congêneres haverão de saber encontrá-la, nos diz Lacan na Nota aos Italianos[3], e que demonstrará que houve a passagem de analisante a psicanalista. Podemos então entender que a análise sempre ocorre na “presença do analista”. Em havendo o des-ser daquele que conduzia a análise, ocorre a báscula que transforma o analisante em analista. Institui-se ali um psicanalista. Momento de passagem. Momento de passe.

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[1] LACAN. O ato psicanalítico. Outros escritos. P. 371.
[2] Lacan. Seminário 15. p. 140
[3] LACAN . Outros escritos. P. 313


XIII JORNADAS DE FORMAÇÕES CLÍNICAS DO CAMPO LACANIANO RIO DE JANEIRO
25 a 27 de novembro de 2011


Local: Hotel Novo Mundo
Praia do Flamengo, 20 - Flamengo

Coordenação:
Elisabeth da Rocha Miranda e Georgina Cerquise

Informações:
Célia da Silva - Rua Goethe, 66 –Botafogo – email: secretaria@fcclrio.org.br
Telefone: (21) 2537-1786 - 2286-9225
Deposito conta bancária: banco Itaú agência 8598 C/c. 06617-6
Informamos que as inscrições realizadas por depósito de conta bancária precisam ser confirmadas por via e-mail

Inscrições até 15/08
Membros e Participantes de FCCL- Rio: R$170,00
Estudantes de graduação: R$110,00
Estudantes de pós graduação: R$130,00
Profissional: R$190,00

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