domingo, 23 de junho de 2013

XIV Encontro Nacional da EPFCL - Belo Horizonte




PRELÚDIO 3




 O desejo entre errâncias e acertâncias

Antonio Quinet

O desejo é a falta que nos move. Sem ele estaríamos em pleno gozo, inertes, estanques, no melhor dos casos – como se fosse possível – no estado contemplativo a que a ética de Aristóteles promete para quem segue à risca a regra do “nem tanto nem tampouco” doorthos logos. E, como um sábio, deitaríamos numa banheira de espuma gozando de visões divinas, ou, na versão religiosa, no êxtase da beatitude em plena comunhão divina com o Outro. E, no pior dos casos, no inferno sado-kantiano do imperativo Goze! A evidência de que o desejo é a expressão da falta estruturante é negada pela covardia ou pela  burrice do neurótico. Ele teima em querer que a falta deixe de faltar. Mas quando isso acontece advém a angústia.
O difícil de suportar da falta não é por ela ser o que nos move, e sim porque dói. Para o neurótico, a falta é um dos nomes do desejo – o desejo que dói - que se declina em insatisfeito, impossível e prevenido. O histérico nunca está satisfeito na praia em que escolheu curtir seu verão. Quem sabe a outra, ali do lado, é melhor? E muda-se para a outra. Mas chega lá e se lembra que ouviu falar de uma mais incrível e vai para lá. Não, aqui não está bom, ainda tem uma outra um pouco mais longe. Mas quando chega lá começa a chover. E volta para casa lamentando como é azarado. O que fiz para merecer isto?  O obsessivo, com seu desejo de derrota, vai rastejando de praia em praia com uma nuvem chovendo em sua cabeça. Viu, eu não falei que não ia dar certo?  O fóbico não sai de casa, pois teme se deparar com  o infinito dos espaços abertos, e fica em casa vendo as praias pela  televisão. Pelo menos aqui, não corro o risco de me afogar!  Todos estes são movidos pela falta na sua vertente de dor. Eis o desejo como errância da dor da falta. O desejo, diz Lacan, é a metonímia da falta.
O desejo, estruturalmente, é articulado no campo da  linguagem a uma de suas leis -  a metonímia – deslizando de palavra em palavra, ao pé da letra, como o “riacho que corre sob os significantes da demanda” (Lacan), a qual é constitutiva da fala do sujeito. É essa estrutura que vai se evidenciando na análise para o sujeito que, ao desfolhar as histórias de suas demandas, seu desejo  se lhe vai delineando como movimento. Desejo claro: articulado sim, e inarticulável também, pois sempre desejo de outra coisa.
Lacan detectou no personagem de Antígona, na peça de Sófocles, um desejo que não é da ordem da falta. Trata-se do desejo decidido, positivado, cuja visada se iguala a seu ato.  É um desejo em ato. Trata-se do desejo, não em sua errância, e sim  em sua acertância. É esse desejo que nos interessa para pensarmos o desejo do analista. O ato de Antígona - que se opunha ao judiciário, mas se baseava em uma ética diferente da moral da Polis grega -  é uma realização do desejo sem Outro. E o coloca em ato, corajosamente, sem estar impedida pelo temor nem pela auto-compaixão.  Desse ato Lacan extrai um preceito ético: Não ceder de seu desejo! Não se trata de uma proposta ao neurótico de que ele não abra mão de sua insatisfação ou de seu derrotismo. Não é o desejo negativado, errante, doloroso e faltante. É de um outro desejo que se trata. É o desejo fundador de uma ética que, para além da falta e da demanda, possa guiar o sujeito em seus atos. É um desejo assertivo, positivamente colocado. Um desejo em ato que, por se situar para além do campo da linguagem, confina com a pulsão de morte e o campo do gozo: com a pulsão de morte, na medida em que esta não é só pulsão de destruição, e sim pulsão de recomeço a partir do nada, de criação ex nihilo; e com o  gozo, por tratar-se  do desejo causado pelo  objeto a mais de gozar.
É o desejo em ato, sustentado por esse objeto, que confere ao personagem de Antígona o brilho do desejo – Hímeros.  Esse termo em grego é extraído da mitologia grega: Hímeros é o desejo sexual, irmão gêmeo de Eros, o deus do amor. Isso nos indica que esse lugar da heroína, criado pelo poeta trágico, é o lugar do objeto que causa nosso desejo, nosso fascínio e nos faz obter o prazer estético de espectador. Antígona, como produto artístico, é ao mesmo tempo aquela que possui o desejo de seguir adiante contra tudo e contra o Outro, e, por outro lado, é aquela que nos co-move. Antígona é, assim, desejante e deesejada. Esse caráter himérico da obra de arte pode nos indicar a posição do analista, por um lado, como desejante,guiado pelo operador lógico chamado por Lacan de “o desejo do analista”, e por outro lado, comodesejável, ocupando o lugar de causa de desejo na transferência para seus analisantes.


terça-feira, 18 de junho de 2013

XIV Encontro da EPFCL - Belo Horizonte





PRELÚDIO 2

“Édipo em Colono” um Paradigma para a Errância do Desejo

                                                                                              Christian Ingo Lenz Dunker

Se Freud fez de Édipo Rei o paradigma da subjetividade dividida entre o filho e o homem, entre a mulher e a mãe, e se Lacan tornou Antígona, filha de Édipo, modelo fundamental do desejo decidido e do ato ético para a psicanálise, nossa época talvez devesse voltar os olhos para Édipo em Colona, como narrativa fundamental acerca da imigração, do refugiado, daquele que está sem lugar. Se Édipo Rei é a história da conquista e perda de um lugar, sobredeterminado pelo poder e pela filiação, e se Antígona é uma trajetória em torno do destino do corpo de um irmão e seu direito a ter seu lugar, entre os mortos e com um funeral apropriado, Édipo em Colono é a história de errância e indeterminação.
Escrita por Sófocles 18 anos após Édipo Rei e Antígona, o terceiro termo da trilogia tebana conta o que acontece com Édipo entre as duas tragédias mais conhecidas. Depois de cego ele ruma para o leste, na companhia de Antígona, murmurando “me phynai” (melhor não ter existido).  A primeira etapa da viagem, a travessia do deserto, termina no bosque de Colona, nos arredores de Atenas. Arredor, subúrbio, ainda não na cidade, mas também não fora dela. Eis nosso herói neste lugar de passagem, de entrância, de fronteira. Neste lugar ele é recebido pelos anciãos como um perigo potencial. Amaldiçoado pelos deuses ele certamente trará o pior. É quando sua filha, Ismene (irmão de Antígona) traz a notícia de que o oráculo de Delfos (o mesmo que previra a maldição de Tebas) de que a cidade que abrigasse o corpo de Édipo seria protegida pelos deuses.
Venho para oferecer-te meu sofrido corpo; ele é desagradável para quem o vê, mas o proveito que poderá trazer torna-o mais valioso que o corpo mais belo.[1]
Desterrado, sem lugar e segregado em vida ele passaria a ser o signo de uma proteção para o lugar que o acolhesse em morte. Interessado neste benefício, Teseu, o rei de Atenas, manda construir um santuário para Édipo e o defende das tentativas de Creonte, de levá-lo de volta a Tebas. Seu próprio filho Polinice assume o trono de Tebas planejando trazer o pai de volta.
Entre Tebas e Atenas, entre Ismene e Antígona, entre Policine e Etéócles, entre Teseu e Creonte, Édipo em Colona é a tragédia do exílio, do marginal, daquele que está para além da perda e da recuperação de um lugar, mas que se tornou ele mesmo “sem lugar”.
Filha do velho Édipo, a que lugar chegamos, Antígona? A que cidade? De que povo é essa terra? Quem irá oferecer a Édipo sem rumo uma mísera esmola? Peço tão pouco e me dão menos que esse pouco e isso basta-me; de fato, os sofrimentos, a longa convivência e meu altivo espírito me ensinam a ser paciente.[2]
Se Édipo Rei é a tragédia do sofrimento gerado pelo pacto e sua violação, e seAntígona é a tragédia daquela que denuncia a insuficiência da lei, Édipo em Colona é a verdadeira história sobre o estado de exceção, do sem papel, daquele que se encontra para além e para aquém da lei.  Édipo em Colona, (de onde deriva a palavra “colônia”), são os loucos, os indígenas, os sem-terra, os desterrados. De todos aqueles que valem mais mortos do que vivos.
É por isso que a tão cobiçada morte de Édipo é recoberta de mistério. Como Enoque e Elias, Édipo talvez tenha sido tragado para o interior da terra, ou então meramente desaparecido. Esta indeterminação pode ser atribuída em parte à maldição de Édipo desfere contra seus filhos. O motivo de sua ira não é muito claro entre os comentadores, no entanto há um escólio ao verso 1375 que sugere que a maldição decorre do fato de que os filhos que habitualmente traziam-lhe alimento proveniente de sacrifício, uma omoplata, por exemplo.  Em determinada ocasião os filhos, por afronta ou esquecimento trazem-lhe uma coxa[3] (alusão ao patronímico familiar). Édipo se enfurece e roga a praga contra os filhos. Observe-se como a praga envolve uma antropofagia simbólica, como se os filhos houvessem esquecido o significante que marca a sua própria linhagem. Há uma segunda leitura que afirma que a maldição decorre da cobiça que os filhos demonstram em relação ao poder do lugar, o poder que adviria da hospedagem funerária do corpo de Édipo. Daí que este tenha escolhido manter secreto este lugar, ou ainda, que Édipo teria sido tragado para o interior da terra para se reunir aos monstros ctônicos inhumanos como a Sphinx e a Píton.
A tumba de Édipo, assim como a de Moisés, pode estar vazia. Mas sua ausência não deixa de ser causa eficiente na narrativa.  Assim também o trono de Tebas se torna um trono transitório, de posse precária e sazonal. Etéocles e Polinice fazem um pacto pelo qual cada um governaria Tebas por um ano e assim sucessivamente. Mas já no primeiro ano Etéocles recusa-se a entregar o poder e expulsa Polinice, repetindo assim a saga da exclusão que incidira em seu pai Édipo e depois cairá sobre sua irmã Antígona. Polinice se refugia em Argos de onde volta com sete exércitos para tomar a cidade de sete portas. Mas Tebas resiste ao cerco criando o impasse e postergando indefinidamente o estado de sítio. Decide-se então que os dois líderes devem se enfrentar poupando assim o sacrifício do povo.  É desta maneira que restam insepultos os corpos dos dois irmão nas cercanias da cidade.   Creonte assume o trono e declara que Etéocles deve ser enterrado com todas as honras enquanto o corpo de Polinice deve ser deixado aos abutres, mais que morto, será esquecido, como se jamais tivesse existido. Simetricamente a seu pai e irmão,  Polinice não terá lugar, seu corpo é apenas carne, não signo simbólico de uma existência. Também simetricamente a seu pai e irmão,  Etéocles, sofre as consequências do apego ao poder e os efeitos da violação de um pacto. Contudo ambos insepultos estão no entorno da cidade, aguardando seu destino. Na fronteira entre o dentro e o fora, assim o lugar onde se situa Colona. A tragédia de Antígona começa pela recusa da protagonista em aceitar o edito de Creonte e pelo seu desejo decidido de que é justo que Polinice receba as mesmas honras de Etéocles.
Ao contrário das duas peças anteriores, Édipo em Colona distancia-se da oposição entre o excesso (hibris) e o erro (hamartia ) na composição do destino (Moira). Édipo se torna um homem cego, envelhecido e prudente (phronésis) que não mais luta contra seu destino ou contra as leis da pólis.

[1] Édipo em Colona, p. 137, v. 636-639.
2 SÓFOCLES. A Trilogia Tebana (406 a.c.)  Édipo Rei, Édipo em Colona, Antígona. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2002. Mário da Gama Kury (trad.), 103:1-6.
3 Serra, O. (2007) O Reinado de Édipo. Brasília: UNB-Universa:539.


domingo, 16 de junho de 2013

Inscrições no XIV Encontro Nacional da EPFCL - Belo Horizonte

As inscrições estão abertas e podem ser feitas através de depósito bancário e envio de comprovante do mesmo e da ficha de inscrição para o e-mail: secretaria.epfclbrasil@yahoo.com.br ou via fax para (31) 3287-7779.
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VALOR DAS INSCRIÇÕES

Prazos 
Profissionais/ membros EPFCL- Brasil
Estudantes de graduação/ funcionários rede   pública e inscritos no sem. Fundamentos da Psicanálise no FCL- BH*
Até 16/06/13
(   )220,00
(   ) 110,00
Até 30/08/13 
(   ) 260,00
(   ) 130,00
A partir de 30/08/13     
(   ) 300,00
(   ) 150,00
No local                           
(   ) 350,00
(   ) 180,00

*As inscrições serão válidas, mediante comprovante de estudante ou de funcionário público, enviado juntamente com a ficha de inscrição.

Dados para depósito:
Associação Fóruns do Campo Lacaniano
Banco: Itaú              Agência:0185
C/c: 99475-3           CNPJ: 03.526.375/001-88
Enviar comprovante de pagamento e ficha de inscrição preenchida


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Informações e inscrições:
Flávia Coutinho
Telefone: 31- 3222-3114 / 31-3287-7779

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XIV Encontro Nacional da EPFCL - A Causa do Desejo e suas Errâncias

PRELÚDIO 1
A causa do desejo e suas errâncias
Eliane Z. Schermann

O tema do nosso próximo Encontro Nacional versa sobre a causa do desejo e sua errâncias. Se a filosofia em Spinoza define o desejo como “a própria essência do homem”, a psicanálise aborda o desejo como algo velado que se desvela na experiência da intencionalidade inconsciente. Esse tema é vasto e, se assim podemos dizer, devido à sua causa, o desejo vagueia em busca de um objeto de satisfação que, no entanto e paradoxalmente, está na própria causa. Daí usarmos o termo “errância”.
Para abordar inicialmente o tema, recorremos à clássica expressão freudiana “Wo Es War, Soll Ich Werden” traduzida por Lacan em “Onde o Isso era, deve o objeto advir”. Com esta expressão, Freud implica o “âmago do ser” no campo do Isso, por ele descrito como o “reservatório das pulsões”. 
Esse tema escolhido para o nosso próximo Encontro Nacional nos leva a considerar o objeto, não apenas implicado na demanda, sempre demanda de amor que se articula nos ditos, mas implicado no próprio desejo. O âmago do ser, lugar onde o objeto funciona como causa, se manifesta na metonímia do desejo relançando suas variações ficcionais a partir do encontro com uma fixidez, “fixão” sintomática balizada pela fantasia, dita por Lacan, de fundamental. Ao sujeito resta se deixar conduzir pelo que a ele se furta e do qual não pode escapar: o objeto da pulsão[1]. Este objeto é causa inefável e, ao mesmo tempo, fixidez, melhor dizendo, “fixão/ficção” instigante da metonímia do desejo.
O que se precipita de um desejo é correlato ao que resta do encontro da deriva da pulsão com um “escolho”. Neste ponto a causa se impõe ao desejo como um imponderável, um indizível. Enfim, deste lugar o desejo pode se traduzir em um dizer sobre a verdade inconsciente.
O pensamento inconsciente regido por uma lei de associação por simultaneidade[2]ou seja, pelo automatismo de repetição, segue as leis do deslocamento e de condensação da linguagem inconsciente. Na regularidade da lei prevalece a repetição de traços de memória do pensamento inconsciente submetidos ao princípio de continuidade/descontinuidade. Contudo, a noção de repetição não se esgota no automatismo da repetição; vai além dela e alcança uma suspensão da associação.
Apenas a partir dos anos 20, Freud descobre que, para além da repetição dos representantes da representação (termo freudiano equivalente ao significante, segundo Lacan), algo se revelava abruptamente por ser incondicional e atuante às cegas. Constata então que o irrepresentável, condição de toda representação, é o que convoca o desejo a se manifestar e a se precipitar em um além do prazer. O que essa outra vertente da repetição reitera é o incondicional da pulsão - Zwang. Não se trata mais apenas de um deciframento da repetição das representações inconscientes, mas sim, da insistência das cifras da repetição das contingências irrompendo do movimento e circuito pulsional.
A descoberta freudiana comprova o que Lacan afirma: “o inconsciente trabalha sem pensar, nem calcular, nem tampouco julgar, e que, ainda assim, o fruto está aí: um saber que se trata apenas de decifrar, já que ele consiste num ciframento”[3].
Teremos que avançar muitos aspectos da teoria e da experiência do inconsciente para falarmos da causa do desejo e suas errâncias. O curso do desejo faz o sujeito retornar às origens, a um lugar ignorado. O enigma desperta o desejo em direção à procura de um certo “saber possível” sobre as causas. Insistente, a causa nada mais é do que aquilo que faz o sujeito gozar na medida em que o inconsciente a determina.
Assim como Édipo é convocado pelo enigma sobre sua origem frente à Esfinge, “decifra-me ou te devoro”, o homem tem o dever ético de decidir entre o deciframento ou a morte. Desta “escolha forçada”, na qual o sujeito sempre perde algo qualquer que seja sua escolha, o sujeito pode se precipitar em algo novo. Se o deciframento sugere algo já perdido que insiste para ser “re-encontrado”, a cifra desta insistência visa produzir sentido e significância. Por outro lado, aquilo do qual o sujeito se furta (por ser perda) nada mais é do que a cifra de seu gozo repetitivo.
Ao tentar se furtar aos desígnios dos oráculos, o personagem central da tragédia de Sófocles, Édipo Rei, nos dá um exemplo da defesa do desejo presente em todo neurótico: “nada quer saber d’isso”. A tragédia da existência desse trágico herói comprova ter sido ele convocado pelo próprio “destino” a responder “aos desígnios dos deuses[4]” com uma “escolha forçada”. Fugindo de seu destino, ele acaba por se constatar na “obediência” a uma Lei que o compelia e o convocava a agir para desvelar o sentido de sua existência. Ao mesmo tempo, a Lei nele determinava uma interdição: a de gozar da mãe, sempre proibida. A castração por ele encarnada na cegueira, como castigo pelo desejo incestuoso, representa o preço pago por todo falante por padecer da linguagem e por ser desejante.
Regulado por uma Lei que mantém inter-dito o “gozo incestuoso”, o que prevalece no neurótico é um “nada saberás”, ou seja, o desejo inconsciente e recalcado. Contudo, deste lugar vazio de significação, uma insistência insidiosa porta ao corpo sexuado um traço distintivo e singular: o traço unário. Este traço é pura insistência que, por uma cifra de repetição, evoca o que no desejo e no sexo é repetida perda. Traduz a repetição de um “não há”, ou seja, “não há relação sexual”, não há encontro com “a cara-metade”. Há uma defasagem entre o que é visado pelo desejo e o que é encontrado. Neste “entre” a causa se produz e precipita o sujeito em ato a partir de sua divisão.
09/05/2013
[1] A natureza do desejo é a de reencontrar a ilusão de uma primeira experiência de satisfação em que o objeto é apenas uma miragem, ou seja, uma “alucinação”. O encontro com o objeto é então apenas o re-encontro com os traços do objeto que a memória tenta recuperar. As marcas da experiência de satisfação, regidas pelo princípio de prazer/desprazer e inscritas no aparelho psíquico pela excitação e pela tendência à redução de tensão do aparelho psíquico, confluem na própria definição freudiana dada ao “estado de desejo”. Freud define o “estado de desejo” pelos resíduos de percepção e de imagens mnêmicas do objeto. O objeto freudiano remete à noção de perda, à noção de desperdício. E, conseqüentemente, remete à sua recuperação (“alucinatória”) para ser possível conceber a produção de prazer ou de sofrimento.
[2] Ibid, p. 423.
[3] Lacan, J. – “Introdução à edição alemã de um primeiro volume dos Escritos”. Outros Escritos. Rio de Janeiro. Jorge Zahar Ed. 2003, p. 553.
[4] Lacan afirma primeiramente que “os deuses são inconscientes”, depois, que “os deuses são do real”. Considerando que o inconsciente, a partir do recalque e do “não é isso”, ou seja, da “negativa” freudiana , pode ser submetido ao deciframento, por outro lado, “é do próprio movimento do inconsciente que provém a redução do inconsciente à inconsciência, na qual o movimento da redução se furta por não poder medir-se pelo movimento como sua causa” (Lacan, Outros Escritos, “O engano do sujeito suposto saber”, 2003, p. 333). “Tudo o que é  inconsciente joga apenas com efeitos de linguagem

quarta-feira, 5 de junho de 2013

Seminário do Campo Lacaniano em Fortaleza - Junho


Sujeito Suposto Saber e a dialética do desejo
 
Convidada: Andréa Brunetto 
Psicanalista, AME da EPFCL-Brasil, membro do Fórum do Campo Lacaniano de Mato Grosso do Sul.   
 LOCAL: 
Shopping Del Passeo - Av. Santos Dumont, 3131 - Aldeota
Sexta, 07/06, 19:30h   
Sábado, 08/06, a partir das 9h 

INSCRIÇÕES:
Por seminário: R$ 160,00 profissional e R$ 100,00 estudante

Delma Gonçalves - coordenação nacional
Sandra Mara N. Dourado - coordenação local
e-mail: sandra.lacaniana
@gmail.com
tels: (85) 9998-3393 e (85) 8889-8779

Bibliografia sugerida por nossa convidada Andréa Brunetto: 

- Seminário de Lacan- livro 5 capítulos 24 e 26
- A Terceira

Observação:
Para este seminário não haverá o grupo de estudos na sexta-feira.

Seminário do Campo Lacaniano em Fortaleza - junho


Seminário do Campo Lacaniano

Sujeito Suposto Saber e a dialética do desejo

SUJEITO SUPOSTO SABER E A DIALÉTICA DO DESEJO

Convidada: Andréa Brunetto, psicanalista, AME da EPFCL-Brasil, membro do Fórum do Campo Lacaniano de Mato Grosso do Sul.  
 LOCAL:
Shopping Del Passeo - Av. Santos Dumont, 3131 - Aldeota
Sexta, 07/06, 19:30h  
Sábado, 08/06, a partir das 9h

INSCRIÇÕES:
Por seminário: R$ 160,00 profissional e R$ 100,00 estudante

Delma Gonçalves - coordenação nacional
Sandra Mara N. Dourado - coordenação local
e-mail: sandra.lacaniana@gmail.com
tels: (85) 9998-3393 e (85) 8889-8779

Bibliografia sugerida por nossa convidada Andréa Brunetto:

- Seminário de Lacan- livro 5 capítulos 24 e 26
- A Terceira

Observação:
Para este seminário não haverá o grupo de estudos na sexta-feira.


segunda-feira, 3 de junho de 2013

Sobre Amores e Exílios


Na fronteira da psicanálise com a literatura

“A honra da literatura é evi­denciar que o homem não é a “fina flor da criação” – essa é a ilusão de seu ser religioso – e sim Sicut pa­lea, isso que Lacan almejava que um analista descobriria ser ao fi­nal de sua análise: nada, dejeto, estrume. E dessa condição de “exi­lado das coisas“, de falta do obje­to, seu ser de desejo pode emergir. Isso é o que melhor a literatura nos mostra. Um mundo de desejos incandescentes, como de forma tão linda Vargas Llosa escreve. Então, por que alguém escre­ve? Cada romancista tem seus mo­tivos. Salman Rushdie, o escritor indiano-mulçumano, autor de Os versos satânicos, alega que escreve para preencher o lugar esvaziado de Deus; Marguerite Duras para cons­truir um exílio, uma pátria do verbo, “uma pátria sem terra, sem nação, a mais sólida do mundo, a mais indes­trutível”. (Andréa Brunetto)

Apai­xonada pela psicanálise, apaixonada pela literatura, Andréa Brunetto transparece essa paixão em to­das as páginas deste livro que, como diz o título, está na fronteira entre uma e outra. Fiel ao preceito de Lacan de que o psicanalis­ta não deve tentar encontrar, a partir de sua obra, as neuroses de um autor, ela se vale dos textos de renomados escritores – como Freud fez com a Gradiva, de Jensen – para ensinar aquilo que o romancista revela, de­monstrando o que ela nos anuncia nas pri­meiras páginas: de que a psicanálise pouca importância tem para a literatura, mas esta tem muito valor para o analista.
Tomando-nos pela mão, Andréa nos faz com­panheiros e confidentes da viagem através desse litoral como se estivesse conversando conosco e tornando-nos cúmplices do seu ar­rebatamento para mostrar como, tanto no amor como no exílio, somos todos estrangei­ros, “desterrados do país-infância”, exilados do inconsciente e habitantes dessa outra cena. Por isso ela pode passear por autores e lugares tão diversos como Imre Kertész, Elfried Jelinek ou Orhan Pamuk, entre ou­tros, e Auschwitz, Viena ou Istambul, evi­denciando que não só a psicanálise, mas também a literatura não tem pátria nem fronteiras.
Porém, não nos enganemos com essa aparente simplicidade. Ela é fruto de uma extensa lei­tura e grande familiaridade com todos os es­critores citados, tanto de um território quanto do outro, evidenciando que o gosto pela lite­ratura que herdou do pai – como nos infor­ma logo nas linhas iniciais – foi inteiramente conquistado por ela (segundo a recomendação freudiana), pois assumido como um desejo seu e “anexado” àquele pela psicanálise.
Viajando por tantas terras, este livro é uma carta-letra que sem dúvida chegará ao seu destino. (Andrea Rodrigues)