quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Espaço Escola

Próxima reunião:
Quinta-feira, 29 de setembro, às 20h30.
Local: sede do FCL-Fortaleza
Textos para esse encontro:
1. Experiência no Dispositivo do Passe, de Colette Soler. Confrência publicada em A Psicanálise na Civilização, ed. Contra Capa;
2. As Condições de um Fim Lacaniano de Análise, de Albert Nguyên, publicado em Stylus revista de psicanálise n.3.

Neste semestre, nossos debates no Espaço Escola se darão em torno do tema do Terceiro Encontro Internacional da Escola - A análise, fins e consequências. 
Coordenação: Andrea Rodrigues
Horário: últimas quintas-feiras do mês, às 20h30
Atividade gratuita aberta ao público
O espírito do Encontro :
Durante três dias, em Paris, é-nos dada a oportunidade de reunir-nos e debater o tema decidido em Roma em julho 2010 : convite antes de mais para testemunhar, interrogar e desenvolver este tema de atualidade para nossa Escola que vem fazer escansão no trabalho de reflexão sobre a experiência do passe, depois de Roma e antes do Rio de Janeiro.
O interesse pelo tema e a sua acuidade impõem-se, tanto pela seriação da experiência como pelos resultados e com eles a abertura epistêmica introduzida pela « positivação do final da análise? a partir da satisfação final obtida, como afeto positivo de conclusão. Haverá que sintonizar os resultados e as opções. O Encontro será colocado sob o signo da experiência, experiência do passe vivida de ambos os lados do Atlântico e que prossegue há já uma década. Respeitando as particularidades históricas e analíticas locais e retomando as nossas opções, poderá resultar em uma melhor homogeneidade das práticas e das designações entre as zonas geográficas: condição sine qua non para que a experiência internacional da Escola siga produzindo um ensino vivo.
O tema permitirá, com o passe colocado no cerne da Escola, o exame das diversas modalidades de final produzidas e com as sequências, e avançar idéias que justifiquem o título acordado : há um período pós-passe que diz respeito à vida do passante, à Escola, e mais fundamentalmente à transformação da relação de cada um com a análise. (trecho da apresentação do Encontro, por Albert Nguyên)

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Cinema no Fórum - Educação

CINEMA E PSICANÁLISE
 
Filme: Educação
Data: 24/09/2011
 
Convidado: Paulo Alves Parente Jr.
 
Retornamos nesse segundo semestre com nossa atividade Cinema e Psicanálise. Desta feita, contamos com a participação de Paulo Alves como nosso debatedor. Logo abaixo, vocês poderão conferir o texto que ele escreveu para introduzir o debate sobre o filme. Ao Paulo, nossos agradecimentos pela rica discussão!
 
Elynes Barros Lima  


“Educação”:  do pai ao mestre do adolescente.
Para o adolescente descrente de uma certa posição do Outro, sustentada pelos ideais parentais, o mestre não seria apenas aquele que sustenta a lei, de forma a reiterar simplesmente a função do pai na infância. Para o adolescente o mestre é aquele que desafia a lei. Como o pai do Édipo tropeça, o mestre, como afirma Lacan, vai ser aquele que se submete a prova da morte.¹ Certamente que, desafia-se a lei para se ter certeza dela.  O adolescente realiza um esforço, diria que se trata de uma tentativa de falsificacionismo,² para demonstrar que a lei paterna só pode ser assumida se for possível falseá-la.
Este tipo de atração por um Outro, que pode dar algo melhor do que o que foi relegado no mito familiar, é patente nas saídas de casa do adolescente, e não está presente apenas nas patologias e nas delinqüências, é o princípio mesmo que vai sustentar o deslocamento subjetivo encenado na adolescência que pode culminar com a formação de uma outra família. De acordo com o psicanalista Phillippe Julien, a precondição necessária é dada pelo imperativo bíblico, “abandonarás teu pai e tua mãe”. ³
No cinema este trajeto adolescente pôde nos ser contado com um roteiro adaptado das memórias autobiográficas da jornalista Lynn Barber. Educação (2009) é um filme britânico da diretora dinamarquesa Lone Scherfig. Nele, vemos Jenny (Carey Mulligan), uma garota de 16 anos que sonhava em estudar em Oxford e para isso dedicava seus dias de adolescente junto com sua família no subúrbio de Londres no começo da década de 60. Por se passar em um período pouco antes de eclodir importantes revoluções que mudariam definitivamente o modo dos jovens olharem o mundo e concomitantemente do mundo pensar sobre a juventude, vemos uma singela apresentação dos conflitos de uma jovem prestes a se tornar mulher.
Um impasse se instala aos poucos, à medida que ela conhece um homem mais velho, David, e por ele se apaixona. Jenny, descobre ao lado desse homem que, para que tudo que esperou até agora fosse possível, ela teve que ignorar uma parte sedutora do mundo. As luzes da cidade, os restaurantes finos, concertos e leilões de obras de arte, assim como as cigarrilhas russas que, até então, eram inacessíveis, de repente passam a serem objetos legitimamente saboreados. Se em determinado momento crucial da trama ela se volta contra seus mestres escolares e zomba de seus pais, tão inocentes quanto ela acerca da verdade, é para cobrar algo que teve que ser escamoteado pela parafernália institucional. Daí, as experiências sexuais e a vivência de um amor na adolescência tornam-se o golpe da graça que impulsionam a denúncia da falência do ethos civilizatório e o seu caráter mortífero pela renúncia do desejo.
Assim, ela se retrata dizendo que agora não é bastante educá-la e preciso que digam por que fazem isso.  Ao rechaçar o seu ideal educativo, Jenny, ao mesmo tempo, recria palavras paternas, ouvidas agora na boca de David. Este homem lhe envolve despercebida em uma atividade suspeita, mas ela segue se deixando seduzir com a oferta de uma vida aventureira e fora da lei.  Contudo, será uma outra descoberta  que nos faz questionar o que pode uma mulher suportar por amor a um homem. Um amor que aceita e até busca avançar para além dos imbróglios da lei parece ser um destino para o fantasma feminino, tanto quanto, pode introduzir seu aspecto mais sombrio, de ali encontrar-se com os rastros de uma Outra. Jenny desse ponto retorna.
Se o filme retrata a adolescência como possibilidade de experimentar uma alternativa forçada, ele não deixa de ressaltar que, de qualquer forma, não é sem passar por ela que o sujeito consente em seu desejo. Pois bem, certamente há um custo pelo desejo, e ele é caro. Quer dizer, há um preço a pagar por nossas escolhas, por nossa relação com a castração. Esta como doença irremediavelmente humana* impõe uma questão ética que orienta a psicanálise e que pode encaminhar o adolescente no efeito do encontro com o analista. 

 ¹ Jacques Lacan. (1969-1970) O seminário, livro 17: o avesso da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed.1992.
 ² David Papineau, "Methodology"  in  A. C. Grayling (org.), Philosophy: A Guide Through the Subject, Oxford University Press, 1998, in http://aartedepensar.com/leit_falsificacionismo.html
³ Phillipe Julien.  Abandonarás teu pai e tua mãe.  Rio de Janeiro : Cia de Freud. 2000
* CAMON, Ferdinando . La maladie humaine. Paris : Gallimard. 1984


terça-feira, 20 de setembro de 2011

XII Encontro Nacional da EPFCL-Brasil - Prelúdio 6




RETÓRICAS DA INTERPRETAÇÃO EM LACAN
Christian Ingo Lenz Dunker

O problema da interpretação em Lacan sempre esteve ligado à sua incursão pela retórica. Menos comentado do que a retórica greco-latina é o interesse de Lacan pela retórica indiana e pela retórica chinesa. Tradicionalmente, esse interesse é entendido no quadro do aprofundamento da noção de linguagem em Lacan 1, que o leva a reconhecer, dentro da linguagem, uma autonomia relativa entre os sistemas de escrita e os sistemas de fala.
O psicanalista é um retor (rhêteur), para continuar equivocando diria que ele retorifica (rhêtifie), o que implica que retifica (rectifie). O psicanalista é um retor, quer dizer que “retas” – palavra latina – equivoca com a retorificação (rhêtification). Se procura dizer a verdade. Se procura dizer a verdade, mas isso não é fácil porque há grandes obstáculos para que a verdade se diga. 2
O trecho ilustra bem como a equivocação com a escrita une o tema da interpretação com a forma retórica. Certas línguas orientais se prestam facilmente para o exame desse tema, uma vez que em muitas delas não há correlação direta entre o escrito e o falado. Contudo, pelos textos que Lacan adota por referência, é possível que seu interesse inclua ainda a procura de um modelo alternativo para pensar a ação e a estratégia. A tradição ocidental de reflexão sobre a ação, no contexto da guerra e da política, no qual a noção de estratégia se desenvolveu, enfatizou, desde Aristóteles até Clausewitz (1996) um pensamento por modelos, uma ciência que se expressaria em uma espécie de geometria do movimento entre a eidos e o telos da ação 3 Isso implicou uma dominação da tática pela estratégia e um método baseado na probabilidade média de casos análogos. A teoria da estratégia chinesa deriva de um contexto diferente da fala de um dirigida aos muitos e indeterminados membros da pólis, reunidos pela situação de deliberação. Ela nasce do discurso pessoal dirigido ao imperador de quem se quer obter benefícios e estabelecer influência. Daí que suas noções fundamentais sejam as de situação e configuração, como no jogo de Go, e não como no jogo de xadrez. Deixar a situação agir em seu favor, esta seria uma síntese da estratégia retórica chinesa. A planificação cede lugar à avaliação do potencial de configurações de uma situação. A soberania do espaço é substituída pela primazia do tempo. A melhor imagem para entender a noção de situação não é a do lugar ou da posição, mas a da água, que se movimenta e se conforma às superfícies pelas quais passa. Daí a importância de detectar o antagonismo antes mesmo que ele tome forma, de tal maneira que a batalha esteja decidida antes mesmo de ser iniciada 4. Em outras palavras, é uma estratégia pensada para fazer o outro agir, para incluí-lo em uma situação, para induzi-lo a uma determinada disposição:
[...] é um tratado de anti-retórica: em vez de ensinar a persuadir o outro fazendo-o ver a justeza, ou pelo menos o interesse de nosso conselho, ele ensina a influenciá-lo de tal maneira que, antes de qualquer conselho, ele seja levado espontaneamente a seguir nossa intenção. intenção. 5
A retórica chinesa está baseada na indução de reações, não do cálculo de ações. Não é uma retórica dirigida àquele que fala como o agente de um discurso, mas da incitação ao dizer do outro e da interrogação necessária para levar o outro a dizer a verdade. Este manejo de contrariedades cujo fim é fazer o outro revelar sua situação, é exercido por alguém que se apresenta como um homem sem qualidades 6. Sua posição jamais é a do senhor soberano, mas daquele que se conforma ao real da situação. Encontramos assim, na retórica chinesa, um contraexemplo para a retórica narrativa grega.
1 LACAN, Jacques. - O Seminário, Livro XIX ... ou pior. Edição de Trabalho CEFR, Recife, 1971.
2 LACAN, J. - O Seminário Livro XV – O Ato Psicanalítico, 1965, Cópia de trabalho EFR, 1977.
3 JULLIEN, Philippe - Tratado da Eficácia. São Paulo, Editora 34, 1994. p. 13.
4 JULLIEN, Pjilippe – Tratado da Eficácia, op. cit., p.165.
5 Id., ibid., p.185.
6 Id., ibid., p.220.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

XII Encontro Nacional da EPFCL-Brasil - Prelúdio 5



Os limites da interpretabilidade

Sonia Alberti
No item c) “A significação oculta do sonho”1 de uma pequena sequência de textos sobre o sonho, Freud cita um exemplo do fato de que, na interpretação do sonho, temos acesso não somente ao conteúdo recalcado inesperado, mas também “entreouvimos  o pensamento pré-consciente nos estados em que verifica sua própria situação interna e que não foram conscientizados durante o dia”2: a simbolização. Observa que a simbolização não é, de forma alguma, uma questão onírica, mas um tema do pensamento arcaico, de nossa “língua fundamental”, como o expressara acertadamente o paranóico Schreber [sic]. Ele acrescenta que o sonho não tem a exclusividade de ocultar de forma privilegiada conteúdos significativamente sexuais, estes também são ocultados nos mitos e nos rituais religiosos, por exemplo. Em consequência, Lacan observa em seu Seminário 3 que “não há nada de comum entre o inconsciente e o oculto”.
No item a) dessa mesma sequência de textos, “Os limites da interpretabilidade”, Freud depreende “que o sonho é uma entidade psíquica interpretável de maneira geral, mas nem sempre a situação permite a interpretação”4 e que às vezes não dá para verificar se a interpretação inclui ou não pensamentos pré-conscientes que podem ter se expressado pelo mesmo sonho. Então, o sentido demonstrado, corroborado, é aquele sustentado pelas associações do sonhador e da avaliação da situação; o que não implica que outro sentido deva ser sempre descartado. Ele continua possível, apesar de não demonstrado (unerwiesen); é preciso familiarizar-se com o fato de tal pluralidade (Vieldeutlichkeit) na interpretação dos sonhos. A pluralidade nem sempre deve ser tomada como responsável pela incompletude do trabalho da interpretação, pois essa responsabilidade pode advir igualmente dos próprios pensamentos oníricos latentes – ou seja, inconscientes. Quanto ao fato de ficarmos inseguros sobre se uma expressão que escutamos, uma informação que recebemos, deve ter esta ou aquela interpretação (Auslegung), sobre a possibilidade de, além de seu sentido evidente, ainda se indicar (andeuten) alguma outra coisa, isso também vivemos em vigília e, portanto, externamente à situação da interpretação do sonho.
Não é a primeira vez que Freud se utiliza do termo Auslegung para a interpretação, normalmente expressada pela palavra Deutung. Já na “Interpretação dos sonhos” se valera, algumas vezes, desse artifício. Em quê ele nos serve senão a pluralizar a interpretação?
Se é verdade, como Freud estabelece em 1925, que a análise de um sonho, orientada a partir das associações do sujeito em análise, pode privilegiar os pensamentos pré-conscientes que não foram conscientizados durante o dia, e se é verdade que a incompletude do trabalho da interpretação pode advir igualmente dos próprios pensamentos oníricos latentes – ou seja, inconscientes, então esse texto de Freud já leva em conta um inconsciente que não sabe – cuja falta de representabilidade é substituída, no material onírico, pelos pensamentos pré-conscientes –, o que o aproxima de um inconsciente real. Este não visa senão “evitar a perturbação do sono” – o ganho de prazer, a Mehrlust(prazer a mais), o gozo. Eis onde, em Freud, já se pode identificar a disjunção entre inconsciente e interpretação, explicitada por Lacan em 1976: “Quando [...] o esp[aço] de um laps[o] já não tem nenhum impacto de sentido (ou interpretação), só então temos certeza de estar no inconsciente”5.
O sonho é operação de ciframento feita para o gozo, para que nesse ciframento se ganhe esta coisa que é essencial do processo primário, a saber, o ganho de prazer. Eis onde Freud faz matemática e onde ele é lacaniano. Lá onde o ciframento se basta, nada atrapalha a função do sonho: a de ser o guardião do sono. Se, inicialmente, o desejo é indestrutível, fundamentalmente porque ele é sempre o mesmo 6, e que é isso que resulta na estrutura – coisa que foi dada de cara pelo primeiro passo feito por Freud, o de ter-se dado conta de que há o Real no Simbólico –, quando nos instrumentalizamos do inconsciente, o que temos? Os limites do ciframento possível, porque o sentido é sempre sexual e o sonho se depara com a inexistência da relação sexual, ele não dá conta do recado... os limites da interpretabilidade são assinalados pela chegada do sentido que não dá conta do recado. Para concluí-lo, Lacan dá o segundo passo: sublinha que a palavra “limite”, aqui, é aquela que vale para a matemática, como em “limite de uma função, como limite de um número real” e que quer dizer, em matemática, “que independente do aumento da variável – ela pode aumentar o quanto quiser –, a função não passará de certos limites”7. Com efeito, limite, em matemática, é o valor para onde vai uma assíntota, e uma função é assintótica quando gradativamente vai dependendo menos de sua variável: o sentido, em nosso caso. O sentido – que é sexual – fracassa porque sempre fracassa aVerhältnis (relação sexual) enquanto escrita, razão que impede seu ciframento – por isso acordamos.
 

[1] FREUD, S. c) Die okkulte Bedeutung des Traumes [1925]. Einige Nachträge zum ganzen der Traumdeutung. Gesammelte Werke, Frankfurt a.M., Fischer Taschenbuch Verlag, v. I, p.569-575, 1999.
[2] Id., ibid., p.562.
[3] LACAN, J. Le Séminaire, Livre XXILes non-dupes errent [lição de 20 de novembro de 1973]. Inédito.
[4] FREUD, S. a) Die Grenzen der Deutbarkeit [1925]. Einige Nachträge zum ganzen der Traumdeutung. Gesammelte Werke, Frankfurt a.M., Fischer Taschenbuch Verlag, vl. I.  p.561-564, 1999. p.564.
[5]LACAN, J. Préface à l'édition anglaise du Séminaire XI [17/05/1976]. In : ______.  Autres Écrits. Paris: Seuil, 2001. p. 571.
[6]    LACAN, J. Le Séminaire, Livre XXI: Les non-dupes errent [Lição de 13 de novembro de 1973].
[7]    LACAN, J. Le Séminaire, Livre XXI, op. cit., lição de 20 de novembro de 1973.

domingo, 18 de setembro de 2011

Cinema e Psicanálise: Ressonâncias - Setembro


Sábado, 24/09, 15h – Educação (Lone Sherfig) - Jenny Carey tem 16 anos e vive com a família no subúrbio londrino em 1961. Inteligente e bela, sofre com o tédio de seus dias de adolescente e aguarda impacientemente a chegada da vida adulta. Seus pais alimentam o sonho de que ela vá estudar em Oxford, mas a moça se vê atraída por um outro tipo de vida. Quando conhece David homem charmoso e cosmopolita de trinta e poucos anos, vê um mundo novo se abrir diante de si. Ele a leva a concertos de música clássica, a leilões de arte, e a faz descobrir o glamour da noite, deixando-a em um dilema entre a educação formal e o aprendizado da vida.

Nesta ocasião, contaremos com a presença de Paulo Alves Parente como nosso debatedor

O Cinema e Psicanálise do Fórum de Fortaleza dá continuidade a sua programação trazendo filmes que abordem a temática do desejo em suas produções. O tema corrobora com o do Encontro anual da EPFCL/Brasil e com o nosso Seminário de Formação local. Esperamos encontrá-los em nossas sessões regadas à pipoca com refrigerante e uma boa discussão.
Lembramos que essa atividade é gratuita e trata-se de um espaço aberto a todos os amantes da sétima arte e da psicanálise.

LOCAL:
Rua Leonardo Mota, 1394, sl 103 - Aldeota - Fortaleza - CE

Informações: Elynes Barros - 8898-7288 (Oi) e 9603-7294 (TIM)

sábado, 17 de setembro de 2011

Twitter

Para quem é usuário do twitter: o VII Encontro Internacional da IF-EPFCL - Rio 2012 também já está no microblog. Para quem tiver interesse, basta seguir @viiencontrodaifepfcl.
Lembrando: a página do Encontro é www.rio2012if-epfcl.org.br.

sábado, 10 de setembro de 2011

III Encontro Internacional da Escola - Prelúdio 3

Um empréstimo

Carmelo Sierra López

Ao tentar falar de minha experiência como passador no dispositivo do passe, me encontro com a necessidade de ter de transcender o particular de cada caso e buscar, caso possível, algum denominador comum com o qual possa me referir como elemento de base da experiência tratada como um todo.

Estar como sujeito nesse momento de passe clinico, segundo está escrito, é o que permite ao analista propor seu analisante como passador de outro sujeito que está decidido a dar conta de sua experiência de mudança, da qual se produziu como efeito um desejo inédito que é o desejo de analisa.

Minha pergunta, desde o principio, foi porque um sujeito em trânsito de seu passe clínico estaria mais capacitado para a transmissão desse testemunho que outro, possivelmente melhor dotado e mais armado de conhecimentos sobre a doutrina e o saber referencial.

No momento em que, como analisante me encontrava, o 'haver sido proposto como passador' foi, para mim, uma clara interpretação surpresa que me transladou como sujeito a outro espaço diferente daquele do qual tinha consciência.

Ali onde me nomearam, um lugar do qual eu parecia querer me ocultar, me convocava a uma função alheia à programação que tinha de mim mesmo. Tudo transcorreu, com a primeira chamada, muito rápido. Se entre o instante de ver e o momento de concluir tudo se resolveu sem tempo de compreender, quem concluiu por mim? Foi um ato. Uma resposta em ato que tinha toda a lógica depreendida ao longo dos anos de análise ao decidir aceitar passar pela experiência. Isso funcionava apesar do escorrego que eu quisera estar, pensei, e me alegrei dessa constatação empírica. Tomei confiança na impressionalidade (?) de um conhecimento sensível que não se deixava intimidar pela dura barreira do telão fantasmático.

Pensei que, se desde os textos fundadores e depois, do tempo transcorrido de outras experiências, se insistia em pôr o acento nesse momento estrutural do tratamento do passador, era porque o testemunho não haveria de ser lido a partir da doutrina, mas, se trataria, definitivamente, de uma escuta do percurso, comportamento e avatares do sujeito passante, quer dizer, daquilo que de alguma maneira deixa sensível mais além do conhecimento. Algo que afeta se se está nesse ponto: pouco vestido de significações fantasmáticas e mais aberto ao emergente fora de sentido. Essa condição, permitiria essa sensibilização à percussão do real que não se deixa apreender no simbólico.

Em cada caso que escutei, um elemento que me apareceu e entrou como fundamental em minha consideração, que despertou e contribuiu, sem dúvida, ao afinamento e atenção na escuta, foi a vividez e convicção manifesta no passante. Vividez e convicção não no formal do relato, porém na decisão com a qual se apresentava e apostava pela experiência de testemunhar.

A historicização da experiência analítica, a lógica e pontos de articulação significante, os momentos de passe e melhora clinica, dali onde havia sido seu sintoma, e inclusive chegar a dar conta de certas experiências de abandono fantasmático, tudo isso foi sem duvida muito mais do que conveniente, se sabe e esta dito, mas o que me interessou e suscitou minha atenção, desde o principio, era essa impressão que tinha de que algo mais passava, atravessando toda essa urdidura significante. Perguntei-me o que era e como se poderia perceber o real que havia em jogo na experiência quando por definição não se sabe formalmente.

A primeira escuta dos relatos demonstrou ser o mais interessante, porque vai se despregando o corpo vivido ou cadavérico do texto que deve falar. A voz do dizer que atravessa a composição formal, inclusive a harmonia que se deixa perceber, é a expressão do que não é apreensível no dito, mas sem ser alheio a ele, quer dizer, tem conexão com o significante, mas não se esgota no sentido significado. É a expressão do não-todo, como poderia ser, ocorre-me, a beleza, para quem a percebe como produto afetivo da obra de arte que a suscita. Algo vinculado a ela, mas depreendido da mesma.

Com a singularidade de cada testemunho, fiz um prognóstico para mim, que nem sempre coincidiu com a decisão que tomou o cartel, e isso não me pareceu estranho nem chamativo, mas me empuxou a repassar os recorridos do processo, a consistência e o sentido do relato e pude verificar que entre o escutado e o anotado, e o que desprendeu do cartel do passe, há vários desajustes, esquecimentos, erros, inclusive lapsos, que me pareceu que não era possível obviar a presença do trabalho do real em jogo. Eram emergências ou acenos de vazio, que formavam parte estrutural do relato e que chamavam a certa mobilização do percurso significante intimamente vinculado a ele. Fenômenos da falha singular que anima cada caso. Essa falta que lhe outorga a descompletude e que permite versões sempre fragmentadas, abre também o campo a uma verdade mutilada que o sujeito só pode reconhecer lendo-a no que se desprendeu de seus ditos.

Desde esse ponto que se escapa, em certa medida, ao matema significante, coloquei essa reflexão sobre minha experiência de passador, e se faço hincapie nestes elementos de difícil formalização é porque considero que o que passa e permite localizar nele o testemunho passador - e permite localizar no testemunho o inédito de desejo do analista - tem certa conexão com a expressão artística, em sua capacidade de conectar com o real.

Não por isso pretendo falar de experiências inefáveis. Insisto em que se não se da um testemunho transmissível desde a lógica formal da doxa, a vividez que deve animá-lo corre o grave risco de desfazer-se em relatos cadavéricos, nos quais a verdade aparece com a marcada aparência de mentirosa.

Considero, também, ao fio do desenrolado, que ademais de ter essa posição subjetiva, de estar ai em seu percurso analítico, o passador deve estar movido pela curiosidade e certo desejo de “experiência”. Não todo sujeito em análise sente essa curiosidade em constatar e experimentar a consistência da teoria e a eficácia dos dispositivos da transmissão.

Parece-me que a possibilidade de portar isso, que do real se impregnou na sensibilidade do passador e que deve depositar nos membros do cartel, está, em grande medida, marcada por essa curiosidade que, ao final, civilizada, não é outra coisa senão o desejo de saber.

Toda essa experiência resultou muito estimulante e teve claros efeitos benéficos em relação a minha análise, senão e, sobretudo, em minha orientação ao trabalho com os colegas nos grupo e instituições.

A partir desta participação no dispositivo, se foi instalando progressivamente o que seria uma transferência de trabalho ao sentir-me concernido por uma causa para a qual tenho trabalhado dois anos, sem atrever-me a assumir o risco de divisão que ela implica.

Esta convicção e perspectiva do trabalho analítico articula-me com meus pares e outorga-me um lugar que faz série com os outros.

Albacete 2 de junho 2011

Tradução de Alba Abreu e Andrea Brunetto